18 de novembro de 2009

AME E DÊ VEXAME

— Meu nome é Maria. Não sei como se faz psicoterapia.

— Diga o que está sentindo agora.

— Meu único problema, doutor, é o medo.

— Nós só temos um problema real: o medo.

— Eu tenho medo de amar.

— As outras formas de medo são mecanismos de defesa e sobrevivência animal. A pessoa humana tem um medo especial e original: o de amar.

— E amar é a única coisa que realmente me interessa.

— É o amor e não a vida o oposto da morte. Precisamos distinguir entre estar vivo e morrer.

— Claro, não estou viva porque tenho medo de amar.

— Você não está morta porque o amor é a única coisa que realmente lhe interessa.

— Precisamente por isso decidi fazer psicoterapia.

— Precisamente por isso, estou certo hoje, decidi ser psicoterapeuta.

— Então os psicoterapeutas entendem de amor?

— Não. Os psicoterapeutas entendem de amor tanto quanto qualquer pessoa. Eu tenho tanto medo de amar como você.

— Como pretende me ajudar?

— Tenho muito mais anos de medo do amor que você. Acho que aprendi alguma coisa enfrentando esse medo.

— E já amou?

— Muito.

— Como?

— Como estou tentando e temendo amar você agora.

— Eu não vim aqui para amá-lo e ser amada pelo senhor.

— Então perde o seu tempo aqui. Quando você chegou, a primeira coisa que fiz foi perguntar-me se queria e podia amar você. Logo senti que sim. Então comecei a sentir medo. E isso provava que já a estava amando.

— Estou começando a sentir medo do senhor.

— Como é esse medo?

— É difícil de explicar.

— Não explique. Descreva apenas o que está sentindo. Esqueça a palavra medo e descreva as sensações e emoções que sente agora.


DO LIVRO ame e dê vexame, do Roberto freire



Fonte:FREIRE, Roberto. Ame e dê vexame. [Rio de Janeiro]: Guanabara, c1990.

Um comentário:

Luana Gabriela disse...

Lizandraaaa que texto show!

Quer dizer que quando surge o medo já estamos amando?.. medoooo! hehehehe

Quem é que entende de amor se nem os psicoterapeutas entendem?
heheh

Bjos

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